Aquecimento a mil faz efeito
Ciente da responsabilidade que tinha em seus pés, o português parecia elétrico desde a primeira aparição pública no Bernabéu. Enquanto os companheiros trotavam e ouviam os gritos do público na entrada em campo para aquecimento, ele surgiu em alta velocidade, dando tiros curtos e solitários. Em seguida, todos os jogadores de linha formaram duplas e trocaram passes, menos Cristiano. Como já é costume, a opção é “esquentar” a perna direita em cobranças de falta sempre do mesmo local: lado esquerdo de ataque, pouco à frente da intermediária.
Logo aos seis minutos, pênalti para o Real Madrid. Era a hora do troco, de “comprar a passagem” para o trem. Se na véspera Messi desperdiçou cobrança que fez falta para o Barcelona, Ronaldo não poderia fazer o mesmo. A própria capa do jornal “Marca” avisava: “Vê se não falha”. E ele não falhou. Após receber palmas das arquibancadas a cada passo até a bola, o chute certeiro: Neuer para um canto, bola para o outro. Real 1 x 0.
Bem aberto pela esquerda, o atacante tinha dupla função: era o jogador mais próximo de José Mourinho, mas também o principal responsável por puxar os ataques merengues. Com Marcelo, levava Lahm a loucura e realizava boas tabelinhas. Em determinados momentos, o brasileiro o chamava sem bola e fazia sinais como se fossem jogadas ensaiadas.
Dica de Mourinho e gol
No minuto seguinte, uma troca de passes acabou em assistência de Özil para Cristiano, que dominou e chutou rápido. Neuer não teve nem tempo de reagir: 2 a 0. Êxtase no Bernabéu, e o lugar privilegiado no trem para festa da Fifa, em Zurique, estava quase garantido. Com seu nome gritado por todo o estádio, o português celebrou o 10º gol em 10 jogos na Champions e retornou para seu canto esquerdo.
O começo avassalador também tem seus contras e o camisa 7 começou a tentar jogadas desnecessárias de efeito. Primeiro, tentou passe estranho e atrapalhou contra-ataque. Depois, escorou de peito para ninguém e viu o Bayern assustar em seguida. Foi o suficiente para cair na real. Entre orientações de Mourinho e pedidos de calma para Pepe, Ronaldo pedalou para cima de Lahm e cruzou com perigo para Benzema, que não alcançou a bola.
Mudanças táticas não funcionam
Pouco depois dos 20 minutos, a primeira boa oportunidade em cobrança de falta. Após jogada individual, Özil foi derrubado exatamente no local do aquecimento. Cristiano conversou, pegou a bola com Xabi Alonso e fez o já famoso ritual. Na cobrança, porém, nenhum perigo. No outro lado, o Bayern marcou. Robben, de pênalti, e a semifinal estava empatada na soma dos dois jogos: 2 a 2.
Antes do fim do primeiro tempo, porém, mais duas oportunidades em um de seus fundamentos preferidos: as cobranças de falta. Na primeira, sobre Di Maria, pelo lado direito, recebeu o incentivo de torcedores com palmas no estilo da música “We will rock you”, do Queen, e errou o alvo. Na seguinte, conversou com Xabi Alonso mais uma vez e deixou a cargo do volante o cruzamento na área. Foi quando se mostrou ansioso e trombou com Khedira ao tentar atacar a bola. Fim do primeiro tempo, e mais um pique para ser o primeiro a descer ao vestiário.
Muito esforço e pouco perigo
Uma arrancada de Pepe, aos 21, entretanto, o despertou. O luso-brasileiro abriu a jogada na direita para cruzamento perigoso de Cristiano. Logo depois, a terceira chance em cobrança de falta. E a terceira sem perigo para o goleiro alemão.
Se não levava perigo, Cristiano não pecou pela omissão e tentou fazer com que o Madrid se mantivesse no ataque. Já de volta ao lado esquerdo, recuperou bola quase perdida após passe longo de Benzema, ficou frente a frente com a marcação e rolou para o francês isolar. Chute ruim, como o do próprio Cristiano em sua quarta e última oportunidade de bola parada.
Mesmo jogando em casa, o Real não conseguia ser o senhor absoluto da partida e sofria com o bem arrumado meio-campo alemão. Com domínio territorial e maior posse de bola, o Bayern girava o jogo e complicava uma marcação que não vinha sendo bem feita por Khedira e Xabi na frente da área. Outro que sofreu para fechar os espaços foi Marcelo, que a partir da metade da segunda etapa passou a receber o auxílio de Cristiano Ronaldo.
Carrinho na defesa e exaustão ao término dos 90
O jogo era lá e cá, apesar das poucas chances de perigo, e Cristiano também seguia esse fluxo. Entrega que o fez desabar exausto no gramado, após desperdiçar contra-ataque no último lance do tempo normal, até ser “socorrido” por Granero.
Erros bobos já na prorrogação
O cansaço antes da prorrogação era evidente. Assim como era evidente que isso não seria motivo para que Mourinho tirasse seu principal jogador de campo. E voltou Cristiano para os 30 minutos finais, quando, empurrado pelo torcedor, o Real ensaiou momentos de pressão. Logo no início, escanteio cobrado em direção ao português, que tentou o gol duas vezes e não foi feliz.
Em uma rara arrancada, CR7 foi derrubado por Luiz Gustavo e caiu em cima da bola. Argumento necessário para permanecer no chão alegando dor e respirando fundo. Pouco depois, a última boa chance com bola rolando: Pepe partiu em disparada, trombou com a zaga adversária e descolou com passe na meia-lua. Cristiano dominou, o Bernabéu levantou-se, mas ele perdeu a passada e chutou na zaga, de canhota.
Já nos 15 minutos finais, o jogador participativo do começo não se fazia mais presente. Errando passes bobos e com chutes sem direção, Cristiano chegou a mancar, a cair sozinho após lançamento de Granero e viu o impedimento de Higuaín atrapalhar sua última oportunidade de evitar a cobrança de pênaltis, após linda jogada de Marcelo.
Filme repetido e frustração
Sentado no gramado, Cristiano tinha a certeza de que evitar a cobrança seria impossível e puxava a ponta do pé para amenizar a dor e se manter aquecido: ele era o primeiro merengue da série. Já com 1 a 0 para o Bayern, partiu para cobrança caminhando, deu um trote do grande circulo até a meia lua e recebeu a bola de Neuer. Antes de colocá-la na marca do pênalti, trocou de uma mão para outra duas vezes, beijou e deu dois pequenos quiques no chão. Era a hora.
Foram cinco passos em corrida lenta até que o sexto terminasse no chute de direita que encontrou a mão de Neuer. A bola mal saiu pela linha de fundo e Cristiano já cobria o rosto. O filme de quatro anos atrás se repetiu. Restava ainda a esperança do final feliz. Enquanto caminhava de volta para o meio-campo, um consolo: os torcedores batiam palmas e gritavam seu nome.
De cabeça baixa e mão direita nos olhos, como se enxugasse lágrimas, sumiu no túnel para o vestiário. Foi sua última imagem, já que não foi visto na zona mista. O trem da Champions League passou.
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